sexta-feira, 10 de julho de 2009

O Diário de Andrés Favas


"Unilateralidade, mão única do homem.Sente-se que viver significa projetar-se num sentido (e o tempo é a objetivação dessa linha única).Não podemos senão avançar por um corredor onde as janelas ou as grades são o incidental naquilo que realmente importa: a marcha para um extremo que (já que o corredor somos nós mesmos) nos vai distanciando cada vez mais do ponto de partida, das etapas intermediárias...E escrevo e não sei dizer como dizer: sentir que minha vida e eu somos duas coisas e que se fosse possível tirar a vida como se tira o casaco, pendurá-la por algum tempo no encosto da cadeira seria necessário saltar planos, escapar da projeção uniforme e contínua. Depois vestí-la de novo ou procurar outra.É muito chato que só tenhamos uma vida ou que a vida tenha apenas um modo de acontecer. Por mais que possamos preenchê-la de fatos, embelezá-la com um destino bem planejado e realizado, o molde é um só: quinze anos,vinte e cinco,quarenta - o corredor.
Levamos a vida como levamos os nossos olhos, do modo que nos modela; os olhos veem o futuro do espaço, assim como a vida é sempre a dianteira do tempo."

(trecho de Diário de Andres Favas - Julio Cortázar )

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