terça-feira, 28 de junho de 2011

Baleia - GRaciliano Ramos


" Baleia queria dormir. Acordaria feliz, num mundo cheio de preás. E lamberia as mãos de Fabiano, um Fabiano enorme. As crianças se espojariam com ela, rolariam com ela num pátio enorme, num chiqueiro enorme. O mundo ficaria todo cheio de preás, gordos, enormes."

( trecho de Vidas Secas sobre a cadelinha Baleia que inicialmente era conto, depois capítulo e por fim a personagem mais carismática do livro, a que mais gosto ).

quarta-feira, 22 de junho de 2011

O Porco do Morin - Guy de Maupassant

" Nós estávamos sós, completamente sós, Rivet e o tio haviam desaparecido numa curva da alameda, e eu fiz uma longa declaração,longa, doce, apertando e beijando-lhe os dedos. Ela escutava aquilo como uma coisa agradável e nova, sem saber ao certo no que deveria acreditar.
Eu acabei por me sentir oprimido, trêmulo, e suavemente, enlaceia-a pela cintura.
Eu lhe falava baixinho. Ela parecia morta, de tão cismada que estava.
Depois sua mão encontrou a minha e apertou-a , eu fui encerrando lentamente o seu talhe num trêmulo e crescente abraço, ela não se movia absolutamente, eu roçava a sua face com a minha boca, e de súbito os meus lábios sem procurar encontraram os seus. Foi um longo , interminável beijo, e teria durado ainda muito tempo , se eu não tivesse ouvido um significativo "hum-hum" a alguns passos atrás de mim.
Ela fugiu por debaixo das árvores. Eu me voltei e avistei Rivet, que vinha ao meu encontro."

( Labarbe narrando um de seus encontros com Henriette , no conto "O Porco do Morin" - um dos meus favoritos do Maupassant . )

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Caetés - Graciliano Ramos - Mais um trechinho...

" -Uma perfeição, o rio , murmurei. Muito branco, cheio de pedras, e largo, um rio que faz gosto. É trabalho seu, d. Marta? E aqueles patinhos de celulóide dão uma graça...Que rio será esse, d. Josefa? É o Amazonas?
Elas aventuraram que talvez fosse o Jordão.
- O Jordão? É verdade, deve ser o Jordão. Onde foi que Jesus nasceu? Em Nazaré...ou em Belém...O Jordão fica por essas bandas. As senhoras sabem se ele passa por Nazaré...ou por Belém? Em todo o caso deve passar perto, o Amazonas, que doidice! É o Jordão, sem dúvida. Pois sim senhoras, um Jordão excelente.
Receberam o elogio, sérias."


"Ia neste ponto, esfregava as mãos e procurava meio de escapar-me , quando Luísa chegou à porta, em companhia de d. Engrácia, d. Priscilla e Vitorino. A Teixeira, que veio pouco depois, apontou-me com um gesto cômico:
-Por aqui, em adoração. Estava lá embaixo, no bazar, chorando com febre.Quis por força ver o presépio, tanto fez que o trouxemos. Sabe muito : a geografia da Palestina e o Evangelho.
Luísa atirou-me um olhar de desprezo, tive a impressão de que em mim havia um desmoronamento. Nada opus aos gracejos da Teixeira."

( João Valério faz- me rir... )

Caetés - Graciliano Ramos


"De repente levantei-me, fui á sala de jantar , chamei :
- Ó d. Maria José, faça o favor. A senhora sabe como se prepara uma buchada?
Ela veio, paciente, enxugando os dedos no avental:
- Sei. O senhor quer comer buchada ?
- Não. Isso é comida de selvagem. Os caetés. Depois lhe conto.
- Mas que interesse...
- É história comprida. Preciso saber como se cozinha um homem. Como é, d. Maria ?
- Um homem? Está aí! Foi o conhaque.
E voltou-me as costas.
- Espera lá criatura.Quem lhe falou em homem? Um bode , é claro, um carneiro.Tira-se o couro do bicho, esquarteja-se . Até aí eu sei.Como é o resto?
- Lava-se tudo muito bem lavado, começou a hospedeira desconfiada.
- Exatamente, numa gamela, já ouvi dizer.E viram-se as tripas pelo aveso com uma vara, também já ouvi dizer. Mas os caetés não tinham higiene.
- Como?
- Uma observação à-toa.Continue.
- É só, está pronto.
- Pronto o quê, d. Maria? A senhora não está vendo que ninguém vai comer aquilo cru?
Ela forneceu-me algumas noções, que reputei preciosas.
- Muito obrigado, d. Maria José. Vou preparar o Sardinha pela sua receita e misturo tudo com pirão de farinha de mandioca. Fica uma porcaria.
- O senhor não quer tomar uma xícara de café sem açúcar?
- Eu? pensa que estou bêbedo? Estou no meu tino perfeito. A propósito, que horas são?
- Cinco. Os outros não devem tardar.
- Cinco? Será possível? Ora veja. A arte é coisa admirável.Com a preocupação de arranjar o jantar dos índios , esqueci o meu jantar.Pois eles que esperem, não comem hoje. E traga-me o conhaque. Deus lhe pague, d. Maria.A senhora acaba de prestar um grande serviço á pátria."

( o personagem João Valério em uma de suas inspirações para escrever seu romance "Caetés"  ).

terça-feira, 7 de junho de 2011

Manuelzão e Miguilim - João Guimarães Rosa


" Mesmo assim, enquanto esteve fora, só com tio Terêz, Miguilim padeceu tanta saudade de todos e de tudo, que ás vezes nem conseguia chorar e ficava sufocado."

" Você acha que a gente devia de fazer promessa aos santos, para ficar gostando de parentes?"

"Dito, vamos ficar nós dois sempre um junto com  o outro, mesmo quando a gente crescer, toda a vida?" "Pois vamos".

"Miguilim , você é meu amigo". - "Amigo grande, feito gente grande, tio Terêz?" "É sim, Miguilim. Nós somos amigos.Você tem mais juízo do que eu..."

( alguns trechos de "Manuelzão e Miguilim"  de João Guimarães Rosa )