sábado, 30 de dezembro de 2017

A MORTE DO PAI - KARL OVE KNAUSGARD


"Quando sua perspectiva de mundo se amplia, não mitiga a dor que acarreta, mas também o sentido dessa dor. Compreender o mundo requer que se mantenha uma certa distância dele. Ampliamos aquilo que é pequeno demais para ser visto a olho nu, como moléculas e átomos, enquanto minimizamos grandezas como formações de nuvens , deltas de rios, constelações.Somente ao trazer as coisas para a dimensão dos nossos sentidos é que somos capazes de fixá-las . E a essa fixação chamamos conhecimento. Ao longo de toda a infância e juventude lutamos para manter a distância adequada das coisas e dos fenômenos . Lemos, aprendemos, experimentamos, corrigimos. E aí um dia chegamos ao ponto em que todas as distâncias de que necessitamos foram determinadas, todos os sistemas de que necessitamos foram estabelecidos. É quando o tempo começa a passar mais rápido. Ele não encontra mais obstáculos, tudo está determinado, o tempo se esvai pela nossa vida, a vida passa num piscar de olhos,e, antes que nos demos conta do que está acontecendo, completamos quarenta, cinquenta,sessenta anos...Sentido requer conteúdo, conteúdo requer tempo, tempo requer resistência. Conhecimento é distância, conhecimento é deixar-se estar e é inimigo do sentido. A imagem que tenho do meu pai naquele entardecer de 1976 é, em outras palavras, dupla: por um lado, vejo-o como o vi daquela vez, com os olhos de um menino de oito anos: imprevisível e assustador, por outro lado o vejo como a um igual, cujo tempo de vida está sendo arrancado em grandes nacos, que carregam com eles o sentido da existência."