se eu pudesse leria todos os livros que gosto pra ti, como não posso, escrevo as palavras encantadas que me encantaram.
quinta-feira, 4 de junho de 2009
O Arco
"O velho quebrou um ramo seco e colocou-o no arco.
Um gramado brilhante,sereno,estendia-se na sua frente e nas folhas recentemente cortadas brilhavam as gotas de orvalho, incontáveis e variegadas.
De repente, o velho bateu com o pedaço de pau no arco e começou a correr.Ria de alegria, correndo atrás do arco como o menino. Sacudia as pernas, alcançava o arco com o pedaço de pau, levantando-o acima da cabeça, como a criança havia feito.
Parecia-lhe que mais uma vez ele próprio era uma criancinha delicada e feliz. Sua mãe ia seguindo-o, olhando-o com um terno sorriso. A princípio sentiu, como uma criança, um ligeiro arrepio na floresta escura, no gramado alegre e na relva macia.
A barba cinzenta, como a de um bode, balançou-se no rosto estragado, e a um tempo o riso e a tosse espoucaram da boca desdentada.
Pela manhã o velho gostava de ir á floresta para brincar com o arco no gramado. Ás vezes temia que o pudessem ver, que rissem, e com essa ideia se apoderava dele um invencível sentimento de vergonha. E a vergonha estava próxima do medo e as suas pernas tornavam-se fracas, e sob ele se vergavam. Então olhava em redor cautelosamente, com a cara envergonhada.
Mas nada - ninguém o vira, ninguém o escutava...E, já tendo brincado, até o coração encher-se de alegria, voltou tranquilamente para a cidade, com um claro e feliz sorriso nos lábios.
E assim ninguém o viu; e nada mais aconteceu. Durante vários dias brincou pacificamente. Depois numa manhã orvalhada, apanhou um resfriado, foi para a cama e morreu. Quando morria, no hospital da fábrica, entre pessoas estranhas e indiferentes, sorriu serenamente.
Estava confortado com a ideia de que ele também havia sido criança, tinha pulado na grama fresca sob as árvores sombrias enquanto a mãe querida o contemplava"
( trecho do conto "O Arco" - do escritor russo Fedor Sologub - Maravilhas do Conto Russo )
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